Ki, Kime, Kiai e Kihon

Ki, Kime, Kiai e Kihon

🥇 Fernando Malheiros Filho

A tradução sempre representou tarefa difícil. Não significa a transposição direta e literal das palavras, mas também o sentido figurado, a influência cultural do texto a ser transferido para o ambiente do leitor da tradução. Injustamente os tradutores ficaram conhecidos como traidores (expressão italiana Traduttore, Traditore) do sentido original do texto, tal a impossibilidade de verter para o idioma destinatário o exato significado o texto a ser traduzido.


O problema ganha em expressão e dimensão quando se trata de dois idiomas (daquele cujo texto a ser traduzido e daquele destinatário da tradução) com diferentes fonéticas e origens distintas, como passa entre aqueles de origem indo-europeia – das línguas latinas – e os idiomas orientais expressos em ideogramas. Perde-se significado na transliteração, na tradução e, principalmente, nas grandes distâncias geográficas, históricas e culturais.


Esse é o desafio daquele que pretende conhecer os significados mais exatos das expressões utilizadas nas Artes Marciais em geral, nas japonesas, e em especial no Karatē-Dō.


Mesmo entre os significados originais, do oriente continental em sua transferência para o arquipélago japonês, perdem-se significações, e suas aplicações à prática, o que realmente interessa, ainda que não seja desprezível o interesse meramente cultural.


O “ki”, representado pelo ideograma japonês 気 tem origem distante, no chinês simplificado responde pelo ideograma que significa “vapor que se eleva da cocção do arroz”. A expressão é cheia de significados metafóricos, quer pela importância do arroz nas culturas orientais, quer pelo significado mesmo da transformação do grão em alimento comestível à custa da aplicação do fogo e água e todas as metáforas que ela pode evocar.


Ademais, o vapor tem significados próprios. Seu estado físico evoca abstração, sentimento, estado de ânimo. Justamente por isso, o ideograma japonês 気 representa sentimento, humor, motivação, intensão, estado de espírito, tanto positivo como negativo, alcançando também a dor, depressão, ou outras manifestações negativas do espírito humano.


Para a arte marcial interessa o sentido proativo, a determinação, a convicção, ainda que o praticante, quando na disputa, deverá estar em busca dos aspectos negativos do “ki” de seu oponente.


Essas constatações levam à conclusão de que a expressão normalmente utilizada para representar o “ki” no idioma português é pobre de significado, não alcançando a real dimensão do fenômeno anímico.


“Energia espiritual”, como comumente se traduz “ki” entre nós, está longe de conter as reais significações dessa manifestação do sentimento humano. Primeiro, por parecer mera manifestação metafísica, talvez exotérica, sem amparo nas reais condições do seu portador (para o bem ou para o mal) levando a crer que o “ki”, no sentido positivo da expressão, poderá ser obtido pela ação dos espíritos ou outras entidades sobrenaturais.


Nada poderia ser tão inexato. O “ki” é fruto do esforço do praticante (budoka), mas não se basta no mero esforço, devendo este ser despendido no caminho correto. O “ki” deriva da ação humana pormenorizadamente estudada, compreendida e repetida, quando o agente se torna inteiramente senhor do que faz, detentor da expertise que adquiriu ao longo do tempo. Está na certeza, na convicção daquele que faz, do que o quê está fazendo é a forma mais eficiente de fazê-lo.


Aquele que age munido da certeza terá a tranquilidade e o equilíbrio próprios a tais agentes, podendo executar a tarefa mais eficientemente, com resultados melhores, despendendo menores quantidades de energia.


Mas para o “ki” não basta ter convicção do acerto, pois essa convicção poderá ser ilusória, mera representação mental do desejo de acertar. Para estes, a ausência do “ki” haverá de ser ainda mais traumática, tanto pela derrota, como pela enorme frustração.


O portador do verdadeiro “ki” sabe que o detém, e por sabê-lo dispensa demonstrá-lo, salvo quando estritamente necessário, ou para ensinar àqueles que desejam dispor do mesmo conhecimento. O “ki” ilusório, ou o “não-ki”, sempre será o maior inimigo do verdadeiro “ki”, remetendo o praticante ao caminho equivocado, cujo percurso, quando trilhado, levará o caminhante cada vez mais para longe da verdade.


Nesse sentido, o verdadeiro “ki” nada mais é do que encontrar a verdade em estado puro, justamente o satori de que fala o Zen.


Para o praticante de Karatē-Dō, essa consciência flutua em oceano da maior relevância. A sofisticação das técnicas, a compreensão do funcionamento corpo e do espírito humano desafiam mesmo as inteligências mais rutilantes. É muito fácil encontrar o engano rotundo vestido de verdade absoluta.


Ao portador do “Ki” é possível a indução de estados mentais alterados, modificando-se a percepção do tempo e do espaço, permitindo-se a aplicação do “Kime”. Esse fenômeno, representado pelos ideogramas 決 め, nada mais representa do que o ato de decidir, mas também finalizar ou levar ao extremo. Confundido com contratação muscular ou foco, perdeu-se a natureza do fenômeno tipicamente anímico.


A decisão (Kime) pode ser qualitativamente boa ou ruim. Dependerá sempre do “ki” do decisor, ou seja, da compreensão daquele que deve decidir sobre os fenômenos de seu próprio corpo e mente, bem como de seu entorno. Conhecer representa o elemento essencial à decisão de qualidade. “Ki” e “kime” passam a representar fenômeno que na filosofia ocidental é conhecido como epistemologia.


É claro que, tomada a decisão e produzido o movimento ou reação, medidas as infinitesimais variáveis de tempo e espaço próprias à luta, a ação humana, portadora do “ki” e do “Kime”, haverão de resultar na exata contratura muscular (nem mais nem menos) e com foco, próprios ao resultado almejado.


Reduzir, contudo, o “ki” e o “Kime” à contração muscular e ao foco significa levá-los à insignificância quando comparados a toda a bagagem de significações embarcadas nas expressões estudadas. Perde-se o verdadeiro sentido, tornando os resultados, senão inexistentes, certamente medíocres.


Esse entrelaçamento entre os conceitos é inextrincável à compreensão dos fenômenos que deles resultam e explicam a enorme dificuldade de reproduzi-los com a mesma eficiência entre os ocidentais.


O aparato técnico, representado pela internalização das ações justas e corretas (elemento do “ki”), a convicção e a decisão pontual (“kime”), entretanto, não bastam à produção do resultado desejado. É necessário também o ânimo de expressar o “ki” representado pelo “kiai”, ou a soma dos ideogramas 気合, isto é, a postura mental e a ação que dela deriva. O ideograma 合 significa expressar, sinalizar, e permite inúmeras combinações ideográficas.


Vale dizer, o “ki” deve ser expressado, manifestado, externado, o que se dá através do “kiai”. O “ki” interno, sem ser agitado para o mundo externo terá pouca valia, mesmo que essa manifestação represente mera abstração (como ocorre na meditação, ou no mero ato de pensar).


Essas expressões “ki”, “kime” e “kiai”, têm maior densidade semântica do que outras, também fundacionais para o Karatē-Dō. Kihon, significa meramente o conjunto de técnicas básicas. O ideograma 基 remete a fundamento, base, alicerce, enquanto o ideograma 本 significa livro, compêndio. Pode ser lido como livro-texto, livro-base, ou o conjunto de conhecimento básico. Kata deriva do ideograma 型 que significa forma, molde, exemplo, que se junta ao ideograma 形 que pode significar, feitio, feição, ambos de larga utilização ideográfica. Finalmente, Kumite, ou os ideogramas 組 手 literalmente significa encontro (組) de mãos (手), mas o primeiro ideograma também evoca grupo, associação, equipe, turma, remetendo a reunião de praticantes para exercitar sua prática em conjunto.


Ki
Kihon ( 基本, き ほ ん ) é um termo japonês que significa "básico" ou "fundamentos".
O termo é usado para se referir às técnicas básicas que são ensinadas e praticadas 
como a base da maioria das artes marciais japonesas . 
基本 [kihon] n
1.
fundamento de a.c., fundo (substância), alicerce
2.
基本の/的な adj elementar, fundamental, básico/-a
3.
基本の/的な adj basal
4.
基本の/的な adj chave

    基[もと]
    base; fundação

    本[ほん]
    livro

きめ [kime] n

cascalho (areia), detritoきめの細かい de grão fino

 [ki] n

ânimo (mente)気の合う人 alma gémea気がめいるような deprimente, depressor気をそそる convidativo/-a気を失う desmaiar, desfalecer (perder os sentidos)何かをする 気がある disposto/-a a fazer a.c.誰かの 気を重くさせる vexar, oprimir alg...気のせいかもしれませんけど。 ...ou estou sonhando?

    []
    espírito; força; sentimento;
    vontade; motivação; intenção;
    sensação

Kiai ( japonês : 気合 , / k i aɪ / ) é um japonês termo usado em artes marciais 
para o curto grito proferidas ao realizar um movimento de ataque.
O dojo japonês tradicional geralmente usa sílabas únicas começando com uma vogal.
O conceito tornou-se uma parte notável das artes marciais asiáticas na cultura popular,
especialmente em filmes de artes marciais, por escrito, muitas vezes apresentadas 
em variantes como Hi-yah! Aiyah! Eeee-yah! ou Hyah! 
O termo é um composto de Ki ( japonês :  ) significa "energia" ou "humor",
um (L) ( japonês :  ), um marcador categórico. [1] 
O mesmo conceito é conhecido como K'ihap em muitas artes marciais coreanas,
como taekwondo e Tang Soo Do, sendo ki a energia e o significado do hap para se unir,
harmonizar ou amplificar , com base na leitura coreana do mesmos personagens;
sua ortografia de Hangul é 기합.
No jogo de tabuleiro Vai o termo descreve o espírito de luta


Kime ( japonês :   ) é uma palavra japonesa. 
É a forma substantiva do verbo "kimeru", que significa "decidir".
(Random House, 1996, Dicionário Japonês-Inglês, Inglês-Japonês, p. 126)

Em tradicional chinesa cultura , Qi ou chi ( chinês :  ; pinyin : qì  )
acredita-se ser uma força vital formando parte de qualquer entidade viva. Qi se traduz como "ar" e figurativamente como "energia material", "força vital" ou " fluxo de energia ". 
Qi é o princípio básico subjacente na medicina tradicional chinesa e nas artes marciais chinesas

Nos idiomas do leste asiático ,  tem três logógrafos:
Qì  é um personagem incomum especialmente usado na escrita de talismãs daoístas.
Historicamente, a palavra  foi geralmente escrita como até a dinastia Han (206 aC-220 dC),
quando foi substituída pelo gráfico clarificado com   "arroz" indicando "vapor
(saindo do arroz enquanto cozinha)."
Este logograph primário, o carácter mais cedo escrito para Qi, consistiu de três linhas horizontais onduladas
visto em Shang dinastia (c. 1600-1046 AEC) script do Oracle ossodinastia Zhou (1046-256 AEC)  
roteiro bronzeware e escrita de selo grande, e Dinastia Qin (221-206 aC) pequena escrita de selo.
Esses manuscritos de oráculos, de bronze e de selos foram usados ​​na antiguidade como 
um personagem de empréstimo fonético para escrever  "implorar; pedir; pedir" que não tinha um caráter inicial.
A grande maioria dos caracteres chineses é classificada como caracteres radicais-fonéticos.
Tais personagens combinam um " caráter radical " semanticamente sugestivo com um elemento fonético que se aproxima da pronúncia antiga. Por exemplo, a palavra amplamente conhecido dào  "o Dao , o caminho" graficamente combina a "andar" radicalcom um shǒufonética "cabeça".
Embora as pronúncias modernas de dào e shǒu sejam diferentes, os antigos chineses * lˤuʔ-s* l̥uʔ-s eram semelhantes. O caractere de roteiro regular qì é incomum porque qì  é tanto o "radical de ar" quanto o fonético, com  "arroz" indicando semanticamente "vapor; vapor".
Este  "ar / gás radical" só foi usado em alguns caracteres chineses nativos como yīnyūn "névoa espessa / fumaça", mas também foi usado para criar novos caracteres científicos para elementos químicos gasosos.
Alguns exemplos são baseados em pronúncias em línguas européias:  (com  fonético) " flúor " e nǎi (com nǎi fonético) " néon ". Outros baseiam-se em semântica: Qing(com um jīngfonética, abreviando Qing"leve") " hidrogénio (o elemento mais leve)"With (com  fonética, abreviando  green "verde") " cloro (amarelo esverdeado) ".
é o elemento fonético em alguns caracteres como kài "ódio" com o "coração-mente radical" ou "atear fogo a ervas daninhas" com o "radical de fogo", e  "para comida presente "com o " radical de comida " .
O primeiro dicionário chinês de caracteres, o Shuowen Jiezi (121 EC), observa que o primário é um personagem pictográfico representando 雲气 "vapores nublados",
e que o completo combina "arroz" com o qi ph fonético , significando 饋米 "apresentar provisões para convidados" (mais tarde disambiguated como ).

Kata (型 ou 形, forma?) é um conjunto de movimentos de ataque e defesa.
Está presente nas mais diversas artes marciais japonesas, realizados em conjunto ou individualmente.
O significado mor é "forma", contudo, adquire conotações diversas, dependendo da arte em questão.

Kata
    型[かた]
    posição; forma;
    modelo; padrão;
    tradição; convenção;
    tipo; estilo

Kumite (組 手) traduzido literalmente significa "mãos de agarrar".
É uma das três seções principais do treinamento de karate , junto com kata e kihon

    組[くみ] grupo; equipa; turma
    手[て]   mão



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🥇 Fernando Malheiros Filho:
  https://docs.google.com/document/d/e/2PACX-1vSuexDyzS2PcBp-syTRkztRB5OzQ8_VGgwPgab57f2t-Hkt-9wSQTnhxiFUAmJcMdjAk67G8PBApD_5/pub

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