Ecologia versus pleonasmo do parágrafo único:
Por Luiz R. N. Padilla, professor da Faculdade de Direito da UFRGS
No início da civilização, as regras propiciaram relativa segurança à população. A paz e o progresso desfrutados foram associados à pré-existência de regras. Incrustada na base da sociedade, a crença na segurança transfigurou-se em imobilismo. Para cumprir o papel de prevenir e solucionar litígios, o processo precisa vencê-lo para evoluir à www.padilla.adv.br/ufrgs/tgp
A consciência ecológica nasceu da constatação da importância de preservar a energia e, há 28 anos, dispomos da Lei nº 6.938/81, de Política Nacional do Meio Ambiente. Nesse contexto, eu me pergunto: Por que ninguém, ainda, propôs o fim dos pleonasmos? Esse recurso lingüístico é legítimo para enfatizar a importância de algum instituto. E, inclusive, pode ser usado com elegância, como nas dezenas de direitos organizados no art.5º, da Constituição Federal. Ao anunciar a enumeração, o caput destacando a isonomia: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:” A seguir, incontinenti, no primeiro inciso, enfatiza-a, mediante outras palavras – elegantemente - para destacar a importância desse direito que, na verdade, é a essência do ideal de Justiça: “I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;” E, sem perder tempo, nem energia, no segundo inciso registra a principal regra da aplicação do direito na realização da igualdade - a liberdade[1] positiva: “II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”
Um dispositivo legal que introduz um conjunto de opções, interdependentes, como as do art.5º da CF, usa incisos, geralmente ordenados por numerais.
Quando a regra possui exceções, ou qualificações que se diferenciam, o caput do artigo é seguido de parágrafos, com cada uma dessas peculiaridades. Contudo, muitas regras têm apenas uma exceção, de forma que o artigo que delas trata contém um único parágrafo. Há centenas de milhares de normas. Praticamente todas contêm uma palavra inútil, não ecológica, desperdiçando tempo e a energia dos envolvidos na comunicação. Ela é repetida nas referências à regra, nos requerimentos, decisões e doutrina. Há necessidade de qualificar como “único” o parágrafo de um artigo? Quando o artigo contém mais de um parágrafo, são numerados, desde o §1º. Se, contudo, for um único parágrafo, não o é. Legislações modernas, posteriores à Lei nº 6.938/81, tem adotado a simplificação do óbvio. Na Lei 9.099/95, por exemplo, os art.41, 42, 43, 50, 54, 55 e 83, contentam em denominar de “recurso” o remédio processual previsto contra a decisão.
Parágrafo único não possui abreviatura oficial e, portanto, deve ser escrito por extenso. Para acabar com isto, basta tratá-lo como o que, de fato, é: O parágrafo, do artigo... Melhor: O §, do art. Economia de toneladas de tinta e papel, energia e tempo, desperdiçados na redação, por extenso, das palavras “parágrafo único”, substituindo-as, com segurança, por §. Porque se referimos a um §, sem indicar um número, obviamente é o único daquele artigo...
Para agradar aos mais apegados ao imobilismo, o fim do pleonasmo pode ser fomentado pelos legisladores: Leis federal, estaduais e municipais determinarão a substituição, em todo sistema, de “parágrafo único” por §, prestando inestimável serviço à ecologia.
O Planeta agradece!
[1] Montesquieu, em “O Espírito das Leis” fornece uma das melhores, se não a melhor, definição do que vem a ser liberdade: “Liberdade é o direito de se fazer tudo o que a Lei permite.”
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